A tua luz é muito clara.

Entrou naquele salão um pouco cansada com os dois pesos que se apoiavam em seus ombros, arrastava uma felicidade tão pouco sincera, mas sorria bastante naquela noite. E quando já tão desanimada com aquele lugar, avistou aquele que nem ela conseguiria explicar, era lindo e algo nele pertencia a ela. Em meio a tanta gente, tanto barulho e confusão, ele brilhava. Ela abriu a bolsa e guardou aquele brilho com carinho, não sabia o porquê, mas ele era especial.
O tempo passou e os dois pesos que a acompanhavam machucavam cada vez mais, porém ela nunca esquecera de como era clara a luz vinda daquele estranho. Pensava nele sem entender como tal sentimento poderia existir, mas pra algumas coisas não existem respostas, ela sabia disso. Se esbarraram tantas outras vezes até que se tornou inevitável um contato, era estranho pra ela estar tão perto dele... O cheiro, a voz, era tudo tão perfeito que os dois pesos caíram, e ela se sentiu leve. Estava apaixonada por um estranho. Claro que esse estranho não fazia idéia de que ela já o conhecia de sonhos e tanta imaginação, tão pouco sentia o mesmo que ela, mas esse era só o começo.
Era estranho não saber nada sobre ele, só um nome, um rosto. Mas ela era tão leve e livre que vôou muito alto, e lá de cima enxergou pessoas que poderiam lhe dizer algo sobre ele, se deixou levar e quando percebeu já era próxima demais, tanto que lhe dava medo. Era muito claro estar com ele, doía, cegava. E foi nesse momento que um pássaro a levou. Levou pra longe daquela luz toda, e como eu já disse aqui, certas coisas não trazem respostas, o pássaro não conseguiu levar a garota tão longe, pois o estranho sentiu que parte dele sentia a mesma coisa, sentia que a presença dela ali lhe fazia brilhar mais, e foi buscá-la. Quando tornaram a se olhar nos olhos, puderam então descobrir que eram mais do que imaginavam, eram do mesmo mundo, dos mesmos sonhos.

Ela disse - Eu não sou daqui.
Ele respondeu - Eu também não.
- Vênus.
- Plutão!

Estavam na mesma sintonia, não entendiam como passaram tanto tempo vivendo em um planeta como esse, com pessoas tão diferentes deles, mas enfim se encontraram. Toda aquela luz agora fazia sentido para ela, e ele sabia que metade da sua luz pertencia a ela.

- Nosso mundo é tão mais bonito que o deles.

Foram felizes. A luz com o tempo foi dando lugar a um coração, que batia forte mas não tinha luz própria. Era feliz, grande, saudável, mas fez com que nossa garota esquecesse o quanto era claro olhar pra um estranho que hoje, de estranho nada tinha. Ela era tão dele, que as vezes ficava difícil dizer para quem se estava olhando. Eram um só, eram perfeitos.
Porém, ela se acostumou a não ver mais toda aquela luz, e foi quando quando algo a cegou novamente, outro desconhecido então? Mas desse planeta? Seria isso possível? Ela nunca soube explicar. O coração que agora substituía a luz do estranho dizia que isso era loucura, mas a luz vinda desse humano era clara demais.
O coração aos poucos foi se cansando, não batia como antes pois a luz do humano lhe deixava fraco. Ela já conhecia esse sentimento, mas de alguma maneira ele era diferente. Percebeu que era impossível, ele era desse mundo, e a menina sabia que não seriam compatíveis.

Seu desconhecido foi embora, os dois pesos voltaram para o ombro da menina, e a luz do humano brilha intensamente. Ela fora tão feliz com seu desconhecido, viveu coisas maravilhosas mas não entendia como o coração pode ter sido tão fraco por não conseguir dominar toda aquela nova luz.

Ela ainda espera que os dois pesos caiam novamente, espera que esse humano deixe de brilhar e que outro ser, de outro mundo, lhe traga um coração novo. Ele ainda faz parte dela, de vez enquando lembram histórias do mundo que criaram pra sobreviver nesse planeta. E ele também não sabe explicar como tudo aconteceu, só sabe que a luz dela é única.

Essa história ainda não tem um final, talvez nem chegue a ter, mas até lá, a garota segue cega iludida por uma claridade sem explicação.